top of page
Buscar
Lucão

Se errar, tanto faz



A poesia foi o gênero da escrita que mais me ensinou a errar.


Quando o poeta Mario Quintana escreveu “A sua bundinha deixou na areia a forma exata de um coração”, possivelmente não estava mirando no prêmio Nobel de literatura. Ou quando Manoel de Barros escreveu que “Formigas carregadeiras entram em casa de bunda” também não estava pleiteando uma vaga na Academia Brasileira de Letras. Mas suas graças, seus “erros” merecem prêmios que a própria literatura não pode dar. A liberdade.


É impossível escrever criativamente sem o erro. O acerto é o que mais estraga uma pessoa que escreve.

Essas são frases estranhas de se escrever em um texto que pretende encorajar você a se soltar mais na escrita. Mas são frases verdadeiras que poetas experimentam para provar para si mesmos que é assim que se escreve melhor, errando.


Não foi tentando acertar um poema que um dia acordei e escrevi “O amor é uma coisa bem besta. E ainda assim eu te besta”. Nem foi tentando ganhar um Nobel que no outro dia eu acordei e escrevi o poema “Eu te bolo”: “Hoje eu não vou escrever sobre o amor / vou trocar a palavra amor por bolo / e em vez de dizer que te amo / eu te bolo até explodir / mas a verdade é que eu te amo tanto / que eu me embolo todo”.


N’outro dia eu também acordei “inspirado” para escrever e percebi a similaridade do som de duas palavras distintas, então escrevi sobre a necessidade das rimas nos poemas e sobre as combinações amorosas assim, bem curtinho: “Eu e você não rima / Rimos”.


É preciso estar disposto a errar para escrever melhor. É nessa pequena fresta que se abre para nós, a de uma pequena possibilidade de errar, que podemos descobrir as novas ideias que tanto procuramos. Pois o acerto é um lugar seguro demais para nos revelar o novo. O acerto é um lugar que normalmente as pessoas vão. Mas é no erro que as revoluções criativas acontecem, que poucas pessoas se embrenham para trazer para o texto a novidade. É errando mais que acertamos mais.


Eu me tornei um poeta da síntese assim, topando escrever meus pequenos erros, meus absurdos, meus textos que eu pensava que professor nenhum fosse gostar, que a literatura não iria receber. Por bem ou por mal, por insistência minha nesse “erro”, e por aprender com os poetas que amo, que hoje a síntese é a minha identidade. E escrevo não só poemas, mas crônicas, prosas longas, romances, palestras, aulas, tudo sem perder meu DNA minimalista. Hoje tenho obsessão pela síntese, pela menor porção de palavras em uma frase. Nem sempre eu erro bonito. Mas quando consigo, é um acerto imenso.


É difícil escrever com coragem. Nem todos os dias eu consigo. Mas todos os dias eu me lembro que é preciso encarar o medo para conseguir escrever meus absurdos, minhas histórias mais difíceis, meu temas mais espinhosos. Pois estão neles a minha verdadeira força literária. Sem essa minha graça, no máximo, me parecerei com os que vieram antes, os que me inspiram, minhas poetas e escritoras que leio tanto.


É preciso encarar o medo de errar. Esse é o melhor acerto que podemos fazer numa jornada criativa. Pois como já disse um poeta do sertão: “Se errar, tanto faz”.


Essa é a minha dica para você hoje, e também uma torcida: erre!


.


Em agosto vou revisitar a Oficina do Erro, numa edição atualizada para encorajar quem gosta e quer escrever com mais liberdade. Saiba mais aqui > > >

Comments


bottom of page