Semana passada eu tive alta da minha mãe.
Desde que saí de casa, tenho o costume de ligar para ela quando as coisas apertam. Quando os pensamentos precisam se acalmar ou quando os sentimentos difíceis não vão embora na hora que eu quero, ainda disco o número do telefone que sei de cor há duas décadas e nos falamos.
Minha mãe sabe quando a ligação é para resolver um problema ou para matar a saudade. Quando é saudade, não nos ligamos. Compramos passagens e nos encontramos pelo caminho. É assim que a gente mata a saudade, indo.
Não nos ligamos tanto. E isso é o contrário de não nos gostarmos. É pela segurança do amor que temos, e pela liberdade de deixar um filho ir, que nos ligamos pouco. Outro dia minha mãe me disse que deveria me ligar mais, que se sentia uma péssima mãe por isso. Disse brincando. Às vezes passamos mais de meses sem nos darmos notícias. A não ser pelo grupo de whatsapp dos filhos, que alimentamos com política, cultura e piadas sem graças. Interagimos, trocamos figurinhas, mostramos que estamos vivos... E por um tempo, isso basta.
Lembro de ouvir minha mãe dizer em algumas conversas que “filho é para o mundo, não para os pais”. Então eu fui para o meu mundo. Ela ficou no dela. E quando não consigo resolver minhas questões, eu ligo e nos falamos por horas.
Na semana passada eu liguei, pois precisava conversar sobre um assunto espinhoso. Fiz o processo todo: disquei, a mãe atendeu, conversamos banalidades, “tudo bem por aí?”, “tudo bem por aqui”, nos atualizamos sobre as vidas um do outro, uma notícia da família, uma fofoca... Até o momento em que a mãe me fez a pergunta que repete em nossas ligações: “Então, o que passa?”. E eu comecei a dizer o que passava, num encadeamento de histórias sobre o meu problema para que me ajudasse a resolvê-lo.
Mas dessa vez não deu tempo. Quando comecei a falar, recebi um alerta no celular que me lembrou de uma reunião que eu tinha naquele minuto. Então tive que interromper nosso papo, com a promessa de nos ligarmos mais tarde.
Não nos ligamos.
Passamos uma semana sem nos falarmos. Pensei em chamá-la para continuar o assunto. Não fiz. “O que ela me diria depois que eu contasse a história?”, me fiz essa pergunta. E pouco a pouco fui me resolvendo com os caminhos que ela me indicaria. Depois fiz a respiração profunda que a mãe sempre me recomenda aos finais das conversas. Puxei o ar três vezes e o problema foi se dissolvendo.
Depois me arrependi de ter resolvido o problema sozinho. Matei nosso pretexto para ficarmos horas conversando. Até pensei em fingir que ainda precisava dela, mas a gente também não é bom com mentiras. A verdade é que tive alta da minha mãe.
O problema agora é a saudade. Então mais tarde eu ligo de novo para saber o que ela me diz sobre esse imbróglio que só piora há anos.
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